sábado, 14 de maio de 2011

Reportagem - Obra-prima

Reportagem - Arte por dentro e por fora
Claudia Bojunga
1/4/2010

Oscar Niemeyer nem imaginava que viria a ser o arquiteto responsável pela construção de Brasília quando projetou o Cassino da Pampulha, em Belo Horizonte, no início da década de 1940. O jovem arquiteto de 33 anos foi designado pelo então prefeito da capital mineira, Juscelino Kubitschek (1940-1945), responsável pela edificação, que faria parte de um complexo de lazer. Anos mais tarde, o colega de profissão Lúcio Costa afirmaria que foi nesse prédio retangular, marcado por linhas retas e curvas e de fachada envidraçada, que nasceu a arquitetura de Niemeyer. Hoje, a construção abriga o Museu de Arte da Pampulha (MAP). 

Curiosamente, a edificação modernista conta com um acervo que é, na maioria, de artistas contemporâneos. “O museu nasce com a proposição de guardar arte moderna, mas a ênfase dele acaba sendo arte contemporânea. A coleção de arte moderna não é expressiva; temos um ou dois exemplares de cada artista”, diz o curador do MAP, Marconi Drummond.

A história da formação desse conjunto de peças está no livro Entre Salões, que será lançado em julho próximo. O título é uma referência ao Salão Nacional de Arte Contemporânea de Belo Horizonte, que começou em 1969 e cuja trajetória se confunde com a do MAP. “A história do museu passa pela história dos salões, não há como dissociar uma coisa da outra”, observa Marconi.

Nesses concursos anuais, cabia a um júri escolher os melhores trabalhos apresentados. O artista que tirasse o primeiro lugar, além de um prêmio, tinha sua obra exposta no Museu de Arte da Pampulha. Este, por sua vez, ficava com a peça. Assim, o número de obras foi crescendo, e hoje são aproximadamente 1600.  “Cerca de 40% do acervo do museu é de peças que vieram de salões nacionais,” afirma Luciana Bonadio, responsável pela Divisão de Conservação e Restauração do centro.

A cidade organizava salões de arte desde a década de 1930; a novidade do final dos anos 1960 foi que o concurso passou a incluir a participação de vídeos, instalações e objetos. O evento ultrapassava a linguagem clássica da pintura e da escultura e “afinava” sua vertente contemporânea, nas palavras de Drummond. É nesse momento que o salão ganha expressividade, atraindo artistas de várias partes do país. A cena cultural se movimentava com a competição entre pinturas, esculturas, instalações e fotografias. Entre os premiados figuraram Eder Santos, Amílcar de Castro, Franz Weissmann e muitos outros. Segundo Luciana, nesse período, cerca de 340 artistas foram premiados.

Entre Salões, organizado por Luciana Bonadio, Marconi Drummond e Fabíola Moulin, traz em suas 200 páginas mais do que um registro das obras premiadas: o crítico de arte Márcio Sampaio assina um ensaio crítico histórico dos salões de 1969 a 2000 (recorte temporal do livro). Para Drummond, o MAP, nos últimos anos, tem tido a preocupação de preservar sua própria memória.

Como parte desse esforço, o museu acaba de inaugurar a exposição “Coisário Cassino-Museu”, reunindo obras de arte que têm alguma relação com a instituição. A instalação “O jogador”, de Laura Belém, é uma delas. A artista espalhou roletas do antigo cassino pelo chão do MAP, numa clara referência ao seu passado.

Outra iniciativa que está ligada à preservação da memória do Museu de Arte da Pampulha é o projeto de higienização e o acondicionamento do acervo arquivístico. “Quando comecei a pesquisar para o livro Entre Salões, vi que era necessário fazer o tratamento dos documentos que já estavam começando a se degradar”, conta Luciana. São 30 mil peças, entre fotografias antigas, registros de exposições, cromos, plantas que traçam a trajetória da construção do museu e de seu acervo. O projeto conta com o patrocínio de R$135 mil reais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Mas o acervo do Museu de Arte da Pampulha não é o único atrativo do local. “Muita gente vem ao museu só para ver a edificação,” afirma o curador do MAP, Marconi Drummond. O cassino teve uma vida curta, de apenas três anos, sendo fechado em 1946, quando o jogo foi proibido no país. No entanto, o tombamento da construção garante a permanência das características definidas por Niemeyer.

Localizado às margens da Lagoa da Pampulha, o edifício tem jardins projetados por Burle Marx (1909-1994) e decorados com esculturas de Alfredo Ceschiatti (1918-1989), August Zamoyski (1893-1970) e José Pedrosa (1915-1989). O cuidado com o projeto está refletido na escolha dos materiais. Na entrada, o chão é de mármore português, e no segundo pavimento, o piso é de peroba. O toque moderno vem da estrutura de concreto armado, das esquadrias de ferro e das colunas interiores revestidas de aço inox. Em vez de escadas, Niemeyer optou por rampas que dão acesso aos três níveis em que está dividido o lugar.

O último deles é o mezanino, onde ficavam as roletas e os ávidos apostadores. No segundo piso, um espelho belga, que data da época da fundação do cassino, reveste totalmente uma parede, escondendo uma porta que dava acesso à área de serviço e à cozinha. Hoje em dia, ela serve de entrada para a parte administrativa da instituição.

Pelos salões do cassino – que se tornaram um point nos anos 1940 – passaram os principais integrantes da alta sociedade mineira, o que incluía o prefeito JK, frequentador assíduo do local. As opções oferecidas na casa agradavam aos mais variados gostos. Para aqueles que não acreditavam em sorte nas roletas havia o Grill room, que era um misto de restaurante, boate e casa de shows. Hoje o lugar, que tinha um palco, tornou-se o auditório do museu.

Na pista, a alta sociedade mineira dançava ao som de música ao vivo sobre o piso colorido, que dava um clima de discoteca ao lugar. O tratamento acústico do salão permitia que quem estivesse dançando não precisasse falar alto ao conversar com seu par. Aos mais tímidos e menos desenvoltos na pista de dança restava apreciar o espetáculo da noite acompanhado de um drinque ou de um jantar servido nas mesas do cômodo arredondado. Não era o caso de Juscelino, conhecido como um verdadeiro pé de valsa. 

Mas a badalação não era exclusividade do cassino; toda a região do entorno passou a receber cada vez mais gente a partir da construção do conjunto arquitetônico da Pampulha. Além do cassino, ele incluía o iate clube, a Casa do Baile e a Igreja de São Francisco, todos às margens da lagoa que deu nome ao complexo. Numerosos barquinhos levavam de uma margem a outra do lago os visitantes que queriam se divertir.

No entanto, a Pampulha não mudou só os hábitos dos muitos mineiros que saíam do centro da cidade e pegavam uma autoestrada, de cerca de oito quilômetros, naquela região isolada; a ousadia e a modernidade do complexo da Pampulha marcaram a evolução urbana de Belo Horizonte. Assim que as construções ficaram prontas, passaram a simbolizar a modernização da capital mineira. Prova do sucesso do projeto é que grande parte da equipe que participou dele voltaria a se reunir, quinze anos depois, na construção da nova capital federal, no Planalto Central. A parceria de Juscelino Kubitschek e Niemeyer, que renderia muitos frutos, foi selada na Pampulha.
 Antes de se transformar em museu, o prédio passou a ser usado para festas de formatura, e sofria com degradações. Em 1957 veio a salvação: depois de uma restauração, o MAP foi inaugurado. Tratava-se da primeira instituição de arte de Belo Horizonte.

Se o tombamento do prédio garante que a arquitetura original do museu seja mantida, iniciativas como o livro Entre Salões e o cuidado com o acervo arquivístico contribuem para preservar algo fora do alcance dos olhos: o passado da instituição.

http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos/reportagem-obra-prima

Comentário
Localizado no conjunto arquitetônico da Pampulha, projetado por Oscar Niemeyer onde funcionava um cassino que teve vida curta de apenas três anos, sendo fechado em 1946 com a proibição do jogo no país.
 Agora como museu de arte moderna e contemporânea, visa atualizar culturalmente a capital mineira e nesse momento o salão ganha expressividade, atraindo artistas de várias partes do país.
Mas o acervo do Museu de Arte da Pampulha não é o único atrativo do local. “Muita gente vem ao museu só para ver a edificação,” afirma o curador do MAP, Marconi Drummond. Niemeyer.

sábado, 30 de abril de 2011

Visita Tecnica Iate Clube de Lagoa Santa

O Iate Clube de Lagoa Santa – fundado em 1979 – encontra-se em total descaso e abandono pelo Poder Público.  Suas instalações servem atualmente para abrigar moradores de rua e usuários de drogas, provocando medo aos que por ali necessitam transitar à noite.  Este patrimônio público já foi uma das  melhores opções de lazer e turismo da cidade de Lagoa Santa.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

COMPLEXO CULTURAL DE VITÓRIA



Complexo cultural promove elogio ao território construído
A carência de equipamentos culturais de maior porte em Vitória levou o governo do estado do Espírito Santo a convidar o arquiteto Paulo Mendes da Rocha, em 2007, para desenvolver naquela cidade um conjunto que atendesse a essa demanda.
O Cais das Artes, cujas obras começaram no ano passado e devem ser concluídas até o final de 2011, é o primeiro projeto do arquiteto construído em sua cidade natal. Ele está sendo implantado na enseada do Suá, em terreno remanescente de um aterro executado na década de 1970 - uma extensa esplanada situada defronte ao canal que conforma a ilha onde se localiza a capital capixaba.
Em memorial, o autor define a proposta como um elogio a esse território constituído pelo conflito entre a natureza e a construção, numa cidade cotidianamente animada pela presença do porto e o enérgico trabalho nas docas. Sua característica central, segundo Mendes da Rocha, é a valorização do entorno paisagístico e histórico de Vitória.
A devoção a esse território levou o arquiteto a tratar a esplanada como uma praça aberta - “um passeio público junto ao mar”, em suas palavras - e a suspender do solo os edifícios do museu e do teatro, para permitir que dali se avistasse o patrimônio natural e arquitetônico da cidade, como as montanhas de Vila Velha e o convento da Penha, do outro lado do canal. A praça contará com cafés, livrarias, espaços para espetáculos cênicos e exposições ao ar livre.


A visão do entorno a partir dela ganhará nova perspectiva no percurso de visitação do museu, cuja circulação vertical se dará em rampas com patamares cristalinos. O próprio conjunto, aliás, deve se tornar uma referência visual.
O Cais das Artes é composto basicamente pelo bloco do museu, com área expositiva de 3 mil metros quadrados, e o do teatro, que terá capacidade para 1,3 mil pessoas.
O primeiro apresenta a lógica estrutural clara que costuma distinguir os trabalhos de Mendes da Rocha: são duas grandes vigas de concreto paralelas, distantes 20 metros entre si e apoiadas cada uma em apenas três pontos.
Entre elas, os salões para exposições se distribuirão em três níveis e extensões variadas. São ambientes que se interligarão visualmente e se relacionarão com a praça por meio de caixilhos inclinados que permitirão a entrada de luz indireta refletida no piso.
O complemento do programa está acomodado em uma torre (22 x 22 metros) que desce à cota do chão e se conecta ao volume principal por pequenas pontes.





No edifício destinado ao teatro, a lateral mais longa (69 metros) contará, em toda a sua extensão, com galerias generosamente largas. Nelas vai ocorrer a circulação tanto de público como de artistas e técnicos, além de abrigarem camarins, salas de apoio e equipamentos. O contato da edificação com o solo se dará apenas nas áreas técnicas sob o palco e no restaurante - este, coberto pelo próprio prédio, vai abrir-se para o passeio. Os pilares extremos do edifício se posicionarão dentro da água, “opção que se justifica pela similaridade entre as características do solo do aterro hidráulico recente e as do leito do canal”, pondera o arquiteto no memorial.

Texto de Adilson Melendez
Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 372 Fevereiro de 2011







COMENTÁRIO



Um importante complexo cultural será construído no Espírito Santo para atender cultura local e valorizar entorno paisagístico e histórico de Vitória.  O arquiteto Paulo Mendes inovará com projeto e principal foco em atender a circulação tanto do público, quanto dos colaboradores do complexo.
Este complexo será impar na cidade, tratando ambiente como uma praça aberta, inovando no conceito arquitetônico da cidade.
Sem dúvida este complexo será de grande valor para população, onde em um só local oferecerá cafés, livrarias, espaços para espetáculos e exposições ao ar livre, e é claro um ambiente inovador e uma nova perspectiva cultural, arquitetônica e paisagístico.


quinta-feira, 28 de abril de 2011

Projeto de revitalização em Washington é exemplo de bom gosto

Na última semana, começaram as obras de revitalização da área do Washington Convention Center, na capital dos Estados Unidos. O projeto, denominado CityCenter DC, é do arquiteto Norman Foster, que desenhou quatro novos prédios para a área de 40,4 mil m² antes ocupada por um grande edifício. O espaço valorizará os pedrestres e as construções de dez pavimentos cada abrigarão hotéis, escritórios, apartamentos, restaurantes e lojas.


Imagem: Piniweb.com.br


O projeto deve receber o certificado LEED Ouro, pois contará com telhado verde e sistema de reuso de água em todos os edifícios. Além disso, os apartamentos são orientados de acordo com o sol, para melhorar a temperatura interna.



Imagem: Piniweb.com.br

A preocupação em tornar espaços urbanos mais agradáveis é uma tendência em novos empreendimentos imobiliários, o que os tornam sofisticados além de valorizar o indivíduo que transita pelo local.

Fonte: Maurício Lima
 
 
COMENTÁRIO
 
 
Com projeto inovador de revitalização da área do Washington Convention Center,  espaço valorizará a construção, tendo em vista a quantidade de pavimentos,  que poderá ser bem aproveitado com diversificação de ambientes.
Outro ponto importante do projeto é o compromisso com meio ambiente, onde serão usados recursos como telhado verde e sistema de reuso de água.
Seguindo a tendência de mercado que é a sofisticação e a preocupação com meio ambiente, a revitalização trará benefícios imensuráveis também para população.

Espaço cultural ajudará a revitalizar Recife Antigo


Após uma sequência de imagens do agreste, o triângulo passou a marcar o ritmo do baião e começou a ecoar a narrativa: “Só voltei pro sertão 16 anos depois de minha ribada...”. A plateia enlouquecida não deixava o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nos últimos dias de seu mandato, se concentrar para ouvir a história de seu ídolo e xará - Luiz Gonzaga, o rei do baião.
A imagem e o som vinham do vídeo a que Lula assistia no Recife, em comemoração do lançamento oficial, em dezembro passado, do projeto do Cais do Sertão, um centro cultural dedicado a Gonzaga. Além de homenagear um dos autores de “Asa branca”, o espaço terá como pano de fundo a temática do sertão brasileiro.
“O sertão não está relacionado só com Pernambuco ou com o Nordeste: ele se estende por grande parte do país. O sertão é Guimarães Rosa, por exemplo”, observa Marcelo Ferraz, que, junto com seu sócio no escritório Brasil Arquitetura, Francisco Fanucci, assina o projeto arquitetônico.
O centro cultural ocupará uma gleba na zona portuária do Recife Antigo e ambiciona ser uma peça importante na revitalização da região.
O desenho propõe um diálogo franco com o único imóvel tombado do entorno, a torre Malakoff. “Inicialmente, a ideia era ocupar um galpão que existe no porto e construir outro volume ao lado. Estamos fazendo algo parecido: no espaço que estava vazio se erguerá um edifício usando alguns elementos do antigo, que será demolido para dar lugar a um bloco novo”, conta Fanucci.
A decisão, que pode parecer um contrassenso, cria um respiro na frente da torre ao abrir um grande vão no nível do pedestre. Assim, o projeto estabelece uma relação direta com o bem tombado: enquanto o prédio antigo (hoje cercado por muro) é valorizado, o novo, com seu gesto, conecta-se à história.
A entrada do centro cultural fica do lado oposto, mais próximo da área de desembarque de navios de passageiros. Os arquitetos criaram uma praça de acesso que evoca o juazeiro, árvore do sertão presente no largo que era local de encontro de sanfoneiros em Exu, cidade natal de Gonzaga.
A abertura na laje de concreto permitirá que o juazeiro cresça. “Quando o sol bater ali, o piso da praça de acesso ficará marcado com a galhada”, antevê Ferraz.
O projeto arquitetônico foi concebido juntamento com a curadoria, realizada por Isa Grinspum Ferraz, Helena Tassara e Marcelo Macca. Depois de algumas peças históricas de Gonzaga, o visitante vai “mergulhar” no sertão ao entrar no “útero”, um espaço ovalado de aço cortén com projeções em toda a volta.
No térreo, o roteiro é indicado pelo rio São Francisco - reverberando a ideia de Lina Bo Bardi no Sesc Pompeia - e conduz o frequentador a uma série de experiências balizadas por temas como “ocupar o sertão”, “viver no sertão” e “trabalhar no sertão”.
Além de outras atrações, o percurso termina no mezanino, onde os visitantes poderão gravar em estúdio versões de músicas de Gonzaga. O edifício possui ainda biblioteca e discoteca multimídia, espaço para exposições temporárias, auditório com 260 lugares, oficinas, salas de múltiplo uso e restaurante na cobertura.


Um dos pontos altos do projeto de arquitetura é o fechamento do prédio novo com elementos vazados de concreto, de 1 x 1 metro, desenhados pela equipe. Além de sombrear e criar galerias internas interessantes, a proposta caracteriza o centro cultural usando a memória arquitetônica do modernismo brasileiro. Ali, é Luiz Nunes - autor da caixa-d’água de Olinda - quem encontra Luiz Gonzaga.



Texto de Fernando Serapião
Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 372 Fevereiro de 2011

Comentario
O projeto cais do sertão foi apresentado por Luiz Inácio Lula da Silva, nos últimos dias de seu mandato, o centro cultural ocupará uma gleba na zona portuária do Recife Antigo e ambiciona ser uma peça importante na revitalização da região.
O ponto mais alto do projeto é o juazeiro, árvore do sertão presente no largo que era local de encontro de sanfoneiros .Os arquitetos criaram uma praça de acesso que evoca o juazeiro a cobertura na laje de concreto permitirá que o juazeiro cresça. O edifício possui ainda biblioteca e discoteca multimídia, espaço para exposições temporárias, auditório com 260 lugares, oficinas, salas de múltiplo uso e restaurante na cobertura.


Transformação reconcilia cidade com a orla do Guaíba

Como boa parte das cidades brasileiras, Porto Alegre tem uma relação desleal com sua hidrografia: a capital gaúcha deu as costas para o rio Guaíba, que percorre parte de seu traçado urbano.
Um muro construído na área central na década de 1940, para conter as cheias, é um símbolo desse divórcio, acentuado quando, a partir dos anos 1970, a estrutura portuária que a servia perdeu importância e o cais Mauá entrou em progressivo declínio.
Ao longo dos anos, tentativas de recuperação desse território foram ensaiadas. A mais recente delas partiu do Consórcio Porto Cais Mauá do Brasil.
Em dezembro, o grupo assinou com o governo do estado um contrato de arrendamento da área por 25 anos e será responsável por implementar os projetos que fazem parte do Complexo Cais Mauá.
Sua intenção é que ao menos parte das obras previstas esteja implantada até 2014, quando Porto Alegre estará sediando jogos da Copa do Mundo.
O plano urbanístico do complexo é do escritório Jaime Lerner Arquitetos Associados, de Curitiba, e o esboço arquitetônico das edificações, do estúdio espanhol b720 Fermín Vázquez Arquitectos, mas em vários momentos os dois trabalharam em colaboração.
Na avaliação de Lerner, trata-se de um momento único na história de Porto Alegre: “A intervenção representa a chance não apenas de revitalizar o cais, mas a oportunidade de alavancar um novo momento para a cidade”, previu.
Reconciliar Porto Alegre e a região do cais contígua ao centro é o cerne da proposta, que a então governadora Yeda Crusius considerou, na assinatura do contrato, um presente de Natal para a população: o setor portuário se reintegrará à vitalidade e à riqueza da área central do município e a devolução da beira-rio ao usufruto da cidade conterá o declínio do local, avaliam os participantes do consórcio.
“Tivemos o cuidado de que o projeto não tivesse só viabilidade financeira. A ideia é recuperar os armazéns e criar um marco para a cidade, fazendo dele uma injeção de vida em Porto Alegre”, observou Lerner.
A recuperação da área, argumentam o arquiteto e seus colegas de projeto, é parte de um processo maior de qualificação do centro, que envolve mobilidade, turismo, revitalização de espaços públicos e do patrimônio histórico.
O consórcio é responsável pela construção, manutenção, conservação, melhoria, gestão, exploração e operação do empreendimento, que se complementa com a implantação de edifícios empresariais, culturais, de lazer, entretenimento e turismo.
A intervenção está dividida em três setores: Gasômetro (37 mil metros quadrados), Armazéns (86 mil metros quadrados) e Docas (64 mil metros quadrados).
Setor Gasômetro1. Centro comercial

Setor Armazéns
2. Beira-rio / 3. Deques / 4. Via interna / 5. Armazéns / 6. Pórtico principal / 7. SPH / 8. Terminal hidroviário / 9. Praça de sombra

Setor Docas
10. Hotel e centro de negócios / 11. Centro de negócios / 12. Frigorífico / 13. Beira-rio / 14. Via de acesso
15. Principal acesso de veícul
O primeiro corresponde ao trecho final da avenida Mauá, em frente da praça Brigadeiro Sampaio e ao lado da usina do Gasômetro. O setor Armazéns, que tem cerca de 1,4 mil metros de frente para o Guaíba, equivale ao território paralelo à avenida Mauá e vai do mercado público até a praça Brigadeiro Sampaio.
Trata-se, segundo o diagnóstico do plano, da parte mais limitante dos trabalhos, uma vez que vários imóveis no trecho são protegidos pelo patrimônio histórico.
Também paralelo à avenida Mauá, o setor Docas tem cerca de 400 metros de frente para a água e abrange o trecho entre a rodoviária e o mercado público - nesse segmento estão as docas de atracação do antigo porto, galpões utilizados como depósitos, um antigo frigorífico e a praça Edgard Schneider.
No setor Gasômetro, o projeto deu ênfase às atividades comerciais, que estarão abrigadas em uma edificação baixa e integrada ao entorno. Ela abrirá o circuito e estará ligada ao Centro Cultural Usina do Gasômetro e à sequência da orla, fortalecendo a frente fluvial da cidade.
As construções, informam os autores, não vão obstruir a relação entre Porto Alegre e o Guaíba. A conexão do setor com a praça se fará através do rebaixamento da avenida João Goulart, permitindo uma nova ligação entre o cais e a cidade.
É no setor Armazéns que se situam os espaços destinados a cultura, lazer, gastronomia, educação e artesanato. A proposta para essa área procurou minimizar as interferências visuais, que buscarão apenas complementar e valorizar os elementos existentes em função de seus novos usos.
O plano considera esse setor estratégico para a intervenção, uma vez que permite uma série de costuras entre o cais e o tecido urbano circundante, além de consolidar um nó intermodal de transporte coletivo, próximo da praça Revolução Farroupilha.
O maior impacto no setor Docas virá da implantação de três torres, que deverão reanimar uma área hoje considerada pouco dinâmica. A vocação do setor, antevê o plano, é acolher as âncoras empresariais e hoteleiras do complexo.
Texto de Adilson Melendez
Publicada originalmente em PROJETODESIGN
Edição 372 Fevereiro de 2011
Por conter fluxos viários metropolitanos e urbanos, o setor receberá um dos principais bolsões de estacionamento. Situado na terceira doca, o antigo frigorífico se tornará espaço cultural e de convívio.

COMENTARIO
A revitalização de Porto Alegre será uma transformação, com a chegada da copa do mundo em 2014 a cidade se prepara para receber os turistas revitalizando os espaços públicos criando um marco para a cidade. Esse projeto é bastante ousado o setor portuário se reintegrará à vitalidade e à riqueza da área central do município e a devolução da beira-rio ao usufruto da cidade
 “A intervenção representa a chance não apenas de revitalizar o cais, mas a oportunidade de alavancar um novo momento para a cidade”

Prós e contras da revitalização de centros urbanos

Os projetos de recuperação e preservação de centros históricos, associados a processos de reestruturação urbana, têm sido uma constante no Brasil, principalmente a partir do final da década de 80 e início de 90. Pelourinho em Salvador, Bairro do Recife na capital pernambucana e o corredor cultural no Rio de Janeiro são alguns exemplos nacionais de locais que vêm sofrendo este tipo de intervenção. Barcelona, Nova Iorque, Boston, Manchester, Paris e Buenos Aires estão entre os exemplos internacionais que marcam o fenômeno mundial de revitalização ou remodelação urbana.
Apesar de ocorridos em diferentes localidades e de possuírem peculiaridades, os projetos são semelhantes no fato de terem obtido investimentos vultosos em locais com grande potencial turístico, que abrigam interesses históricos e que, em períodos anteriores, tiveram um apogeu relacionado a uma atividade econômica específica.
Certamente existem as mais variadas combinações entre o que deve ou não ser realizado na remodelação urbana, mas o fenômeno, no Brasil, é marcado por duas posições que mais se destacam no debate sobre o tema. Em linhas gerais, de um lado, defende-se a necessidade de reestruturação de centros urbanos dada a caracterização desses locais nos últimos anos pela violência, marginalidade, decadência das construções etc. Esse grupo afirma que investimentos do setor público e privado podem reverter esse quadro, tornando os locais mais atrativos, inclusive para novos investimentos, o que impediria que se iniciasse um novo empobrecimento após a recuperação. A principal aposta é na preservação do patrimônio histórico e nos investimentos culturais.
De outro lado, acusa-se as iniciativas de revitalização dos centros urbanos de reproduzir um processo de "gentrificação", isto é, o enobrecimento de locais anteriormente populares. O resultado desse processo seria a produção de uma cidade desigual, com a expulsão da população de baixa renda das regiões revitalizadas em prol de interesses econômicos das elites, que se beneficiariam. Nessa visão, a cultura torna-se apenas um captador de investimentos, uma mercadoria em torno da qual formula-se (importa-se) um consenso sobre o que deve ser a cidade, financiado pelo capital privado e internacional.
O professor Silvio Mendes Zanchetti, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e a professora Norma Lacerda, diretora geral de urbanismo da prefeitura de Recife, avaliam a revitalização de áreas históricas como uma estratégia de desenvolvimento local. Segundo eles, em função do declínio da economia e da crise fiscal e financeira que caracterizou a economia no início da década de 80, o governo central desobrigou-se das políticas públicas, transferindo responsabilidades para outras instâncias, como os municípios. Nesse contexto, deixou-se de manter o modelo de investimentos em infraestrutura urbana e as prefeituras foram obrigadas a gerar recursos e elaborar novas estratégias de desenvolvimento.
Para Zanchetti e Lacerda da UFPE, num mundo globalizado o que decide o jogo da competição por investimentos produtivos são as especificidades das localidades, sustentadas pelos atributos ambientais, culturais e históricos das cidades. "As antigas áreas urbanas assumem um papel importante na construção de políticas locais de desenvolvimento. São políticas de desenvolvimento voltadas, em geral, para a revitalização de áreas urbanas deprimidas, subutilizadas ou abandonadas, que perderam vitalidade econômica", dizem.
Mas as questões sobre a revitalização urbana não encontram apenas esse tipo de avaliação. A professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, Ermínia Maricato (veja artigo nesta edição), abordou outro ponto de vista durante a abertura da conferência "Cidades, populações urbanas" no segundo Fórum Social Mundial. A professora da FAU - USP apontou a disseminação de modelos internacionais de urbanismo, que atropelam condições ambientais e culturais específicas de cada sociedade, especialmente nos países periféricos"
A crise econômica e financeira da década de 80 e a consequente transferência de responsabilidades do governo central para outras instâncias, apontadas por Zanchetti e Lacerda, são pensados a partir do desmonte do Estado provedor relacionado ao processo de globalização. As conseqüências disso são a perda de direitos sociais econômicos, a privatização de serviços públicos e o fortalecimento da ditadura do mercado, entre outras. Em "Cidade do Pensamento Único", os professores Ermínia Maricato, Carlos Vainer e Otília Arantes chamam atenção para esse processo. Arantes destaca ainda a mercantilização e a centralidade da cultura, num processo comandado pelo capital, que caracteriza os modelos europeu e americano de cidade-empresa-cultural importados pelo Brasil. Ainda segundo Ermínia Maricato, as cidades de países periféricos e semi-periféricos acabam, constituindo ilhas em determinados locais que mimetizam o Primeiro Mundo, onde residem os detentores do capital, cercados de "cidades ocultas" ignoradas pelo Estado.
Para Carlos Vainer, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os debates sobre revitalização de áreas urbanas, centros urbanos ou áreas históricas das cidades incorrem num grande equívoco. "A discussão está fundada na idéia de que estas áreas não possuem vitalidade. Na verdade, essas áreas têm uma extraordinária vitalidade, mas foram, em muitos casos, ocupadas por grupos sociais de baixa renda. O que está sendo feito é renegar um tipo de vitalidade e recuperar essas áreas para determinados grupos sociais", afirma ele.
Vainer defende que o problema dessas áreas não é a de falta de vitalidade mas a falta de investimento público, justamente porque são locais ocupados pelas camadas menos favorecidas. Ele contradiz a afirmação de que as classes de baixa renda não valorizam áreas históricas ou as áreas urbanas em que vivem. "A sobrevivência da riqueza patrimonial dessas regiões se deu graças aos grupos de baixa renda e não a outros. É como expulsar os índios da floresta para preservá-las, sendo que, graças a eles, ela ainda está preservada. Mesmo assim, retiram os índios e fazem reservas indígenas", diz ele.
Outra acusação de Vainer é em relação às parcerias entre os setores público e privada, nas quais ocorre transferência de investimentos do primeiro para o segundo. "Se não fosse o investimento público, o investimento privado seria praticamente inviável. O público entra com o dinheiro e o privado com os benefícios decorrentes da valorização imobiliária e de projetos de natureza econômica", diz. Ele classifica como escandaloso o projeto Estação das Docas para revitalização da zona portuária da cidade de Belém, promovido pelo governo do estado. Segundo ele, o projeto construiu um shopping e restaurantes luxuosos, financiados com vinte milhões de reais do dinheiro público. "Um projeto que só se sustenta com dinheiro público e que é destinado à parcela mais rica da cidade de Belém", conclui.

COMENTARIO
Percebe-se que projetos de revitalização e preservação de centros históricos são alvos de altos investimentos durante anos contínuos, ligados diretamente a reestruturação urbana. É interessante observar que os casos de revitalização apresentam uma articulação entre o apelo turístico  e afastamento da população dos centros urbanos, como uma prática usualmente excludente,  e uma vigorosa resistência a estes processos,  com apropriações bastante inovadoras das áreas revitalizadas.